O povo existe. Logo, a nação existe. O que o faz duvidar a si, meu caro pessimista, é que, quando V. considera a nação nunca considera o povo, que é no entanto, a sua parte principal. V. considera as classes superiores, reconhece-as cada vez mais numa decadência lastimável, e como, no seu falso ponto de vista, as classes superiores constituem a nação, V. conclui que a nação está perdida e nada há a fazer dela. Tudo vem de que V. desconhece o povo, tudo vem de que a sua educação aristocrática e pedante não o habilitou a conhecer, tudo vem de que V. no fundo o despreza. Para V. o povo continua a sua tradição miserável e não tem papel a desempenhar. Não constitui o fundo social, o seu fundamento, a sua base, mas uma vasa, uma escória. Dir-se-ia que V. é um individualista, mas não é. É apenas um entendimento afidalgado, que não reconhece a sociedade senão nas elites e para quem tudo o mais é plebe. No seu conceito, a sociedade, toda ela, só seria digna se fosse uniformemente constituída de doutores.
(…)
O que se pede ao povo? Cultura? – Não! Consciência. E é porventura a consciência popular o efeito de uma cultura doutoral como a sua?
JOÃO CHAGAS, Elogio do Povo
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