quinta-feira, 22 de outubro de 2009

UMA VIAGEM PELA EUROPA CENTRAL

Realizei, no passado mês de Agosto, um circuito turístico pela Europa Central, visitando Budapeste, Viena, Bratislava e Praga. Uma viagem memorável a todos os títulos!

Com razão Budapeste é conhecida por “Princesa do Danúbio”. De facto, unindo as duas antigas cidades, o Danúbio confere-lhe uma encantadora beleza. O rio é o eixo principal do desenvolvimento da cidade, hoje como no passado - um modelo que gostaria de ver imitado em Coimbra. Contemplando a imensidão das suas águas, compreendi melhor o potencial económico gerado ao longo de séculos, desde a Idade Média, por esta autêntica auto-estrada fluvial, como via principal do comércio entre o Oriente ao Ocidente. A visita à Praça dos Heróis (fundadores da Hungria), fez-me reflectir sobre os mais de mil anos de história do povo húngaro e sobre a retórica do retorno identitário usada por uma extrema-direita que, nas últimas eleições europeias, conseguiu 15 % dos votos. O Parlamento mais parece um palácio imperial, pela sua beleza arquitectónica e sumptuosidade decorativa. Curiosamente, é nele que se encontram guardados os antigos símbolos do poder real, talvez para significar que é no Parlamento que em democracia se exerce o poder em nome da nação soberana.

Viena é verdadeiramente majestosa, sobretudo pela grandiosidade arquitectónica do conjunto dos palácios imperiais dos Habsburgo. Foram sete séculos de poder e de opulência, primeiro com o Sacro Império Romano-Germânico, depois com o Império Austro-Húngaro, até à derrota na I Grande Guerra, para onde o empurrou o absolutismo militarista de Francisco José. Felizmente, o militarismo do passado está hoje dissolvido na preferência generalizada dos austríacos pela cultura da ópera, do teatro, dos concertos, da música em geral, que faz de Viena uma cidade única, símbolo das artes musicais, pesem embora alguns resquícios de que se aproveita conjunturalmente uma xenófoba extrema-direita. E, uma vez mais, a beleza do Danúbio, a bordejar a cidade.

Bratislava é o nome actual da capital da Eslováquia após o “Divórcio de Veludo” de 1993. Importante centro administrativo e económico, desde o primitivo Império de Samo (séc. VII – IX), a expansão do Império Otomano pelo território da Hungria transformou-a em cidade real de 1536 a 1848. Posteriormente foi perdendo importância, com a formação do Império Austro-Húngaro e a criação da República da Checoslováquia. A curta passagem por esta outra bela cidade do Danúbio foi bastante para pôr em evidência as tendências chauvinistas que se vivem actualmente no país, com o nosso guia, de nacionalidade húngara (mas que falava bastante bem o português), impedido de se expressar publicamente na sua própria língua, devido a uma recente lei que proíbe o uso das línguas minoritárias, e que visa especialmente os húngaros.

Praga é o deslumbramento total, a apoteose final! Única na sua beleza, bem merece os vários apelidos que lhe são atribuídos: “cidade das cem torres”, “cidade dourada”, “mãe de todas as cidades”, “coração da Europa”. As suas encantadoras praças, pontes, ruas e ruelas, fazem de Praga uma autêntica galeria de arte ao ar livre. A Praça da Cidade Velha trouxe-me à memória a intolerância das guerras religiosas e políticas do passado, com o monumento a John Huss, precursor da Reforma, supliciado na fogueira em 1415, e o memorial lembrando a execução nessa mesma praça, em 1641, de 27 nobres da então Boémia, durante a Guerra dos Trinta Anos. Porém, a praça é também hoje um símbolo de tolerância, com a igreja católica de Nossa Senhora de Týn convivendo bem próxima com a igreja luterana de S. Nicolau. Na Praça Venceslau, justamente considerada a mais bela da Europa, um memorial homenageia as vítimas da dominação comunista, e um outro lembra o estudante Jan Polach, que, naquele local, em 1969, se imolou pelo fogo em protesto contra a repressão soviética após a fracassada revolução de 1968. Preservar a memória é o melhor antídoto contra as tentações regressistas! Destoando do espírito cosmopolita que se vive hoje em Praga, Vaclav Klaus, actual Presidente da República, hostil à União Europeia, orgulha-se de afirmar que será o último a promulgar o Tratado de Lisboa. Como parece já longínquo o tempo de Vaclav Havel! Mais um sinal dos novos e velhos riscos nacionalistas que teimam em ensombrar o futuro da União Europeia, e o nosso! Felizmente, Vaclav Klaus parece não gozar de grande apoio interno.

Enfim, viajar é também aprender, vendo e reflectindo!


AUGUSTO MONTEIRO VALENTE - Associado da ALTERNATIVA

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