A situação começou a mudar de aparência aquando do golpe militar — embora ainda apoiado por civis — de 14 de Maio de 1915, que pôs fim ao Governo ditatorial do general Pimenta de Castro. Foram a Armada, conduzida por Leote do Rego, e a Guarda-Fiscal as forças que derrubaram o Governo. Tratou-se da primeira intervenção militar na condução da política republicana. Poder-se-ia dizer que esta havia resultado de um pronunciamento militar — que teve em Machado Santos o seu líder evidente — ocorrido em Janeiro e que passou à História como Movimento das Espadas o qual levou à presidência do Ministério o general Pimenta de Castro.
Na origem destas movimentações estava a intervenção de Portugal na Grande Guerra, bem vista e desejada pelos republicanos mais radicais e indesejada pelos mais conservadores e pelos monárquicos.
O conflito militar havia desarticulado os circuitos comerciais da Europa e, até quase, os de todo o mundo. Em Portugal, a par do aumento do custo de vida, rareavam os alimentos mais essenciais. As classes sociais mais desfavorecidas começavam a sentir o peso da guerra, embora fossem incapazes de perceber que este mal não se limitava exclusivamente a Portugal; ele era geral e total.
A intervenção na Grande Guerra, a partir de Março de 1916, obrigou à incorporação de muitos milhares de homens nas fileiras ao mesmo tempo que cresceu exponencialmente o número de oficiais do quadro permanente e milicianos do Exército. Estava a consolidar-se a segunda linha fracturante da 1.ª República.
Na sequência do final do conflito armado as economias da Europa encontravam-se praticamente desmanteladas, a crise era generalizada e fazia sentir-se mais forte nos países de menores recursos e com menor capacidade interventiva na reposição dos circuitos abastecedores. Era o caso de Portugal.
Em tal conjuntura a redução dos efectivos militares impunha-se como medida económica e financeira, todavia, a força da corporação era de tal natureza que, mesmo não vendo alternativas de progressão na carreira, os oficiais preferiram ficar longos anos nos mesmos postos com vencimentos baixos a ter de enfrentar um mercado de trabalho em decréscimo. Este facto, articulado com o desaparecimento de dois dos partidos republicanos — o evolucionista e o unionista — e uma profusão de partidos de pouca duração, veio gerar uma nova conjuntura política depois da morte violenta de Sidónio Pais. O partido democrático — já não liderado por Afonso Costa que se havia radicado em França — optou por favorecer as Forças Armadas, dando-lhes um papel de relevo no quadro dos elementos de pressão do regime. Primeiro, foi a vez da Guarda Nacional Republicana (GNR) se tornar uma força decisora dos destinos políticos nacionais e, depois, foi o Exército que, a partir de 1924/1925, se afirmou como força fracturante do regime quando se clamava por uma ditadura — ainda que provisória — quando já aparecia como impossível o entendimento entre os partidos políticos republicanos. Tudo estava a ser posto em causa face à ingovernabilidade do país.
O golpe militar de 28 de Maio de 1926, antecedido por uma outra tentativa não vitoriosa, colocou nas mãos do Exército e, especialmente, nas mãos dos tenentes, os destinos nebulosos da República, já que ninguém tinha a certeza de nada quanto ao regime ou ao sistema de governo. Foi nesta altura que, de modo velado, mas convergente, os elementos integrantes da primeira linha fracturante da 1.ª República se conjugaram com os elementos integrantes da segunda linha fracturante — as Forças Armadas — para aniquilar a democracia e, acima de tudo, a ideia de progresso e modernidade que estava associada à proclamação do regime na manhã de 5 de Outubro de 1910.
Em síntese, pode dizer-se que a 1.ª República ditou a sua perda quando, lutando pela necessária mudança, criou a primeira linha fracturante ao contrariar a influência da Igreja Católica em Portugal e a segunda ao dar importância excessiva ao Exército na sequência da participação na grande Guerra.
LUÍS ALVES DE FRAGA
Amigo da ALTERNATIVA
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