quinta-feira, 29 de maio de 2008

MEMÓRIAS DE UM CRAQUE

Um sábado em que tinha oito anos e boné de grande pala na cabeça dei por mim a desembrulhar cinco tostões de rebuçados dos “jogadores”, simpáticos drops com sabor a coisa nenhuma senão a açúcar e, por dentro, um cromo representando um craque do futebolinha de então. Custava cada um dez centavos. Havia uma caderneta onde a gente colocava, de acordo com a numeração, os cromos saídos, formando assim as equipas da Primeira Divisão. (Sucedia por vezes aparecer no Atlético um jogador que entretanto mudara para o Belenenses ou vice-versa, mas não fazia mal. )


Fernando Assis Pacheco (1937-1995), Memórias de um Craque

terça-feira, 27 de maio de 2008

HOMENAGEM AO RISO - GROUCHO MARX

O amor não era nada fácil para o homem pré-histórico. E mesmo agora, também não é nenhuma pechincha. O problema do amor está em que muita gente o confunde com uma gastrite. Depois de curada a indisposição, descobrem que estão casados com uma pequena que não desposariam nem que os matassem. Alguns dos primeiros subprodutos do amor do homem foram o salão de beleza, o bicarbonato de soda e a família. A família, como provavelmente sabem, é uma unidade social baseada no agrupamento instintivo de todos as animais – por exemplo, a mãe da esposa, as duas irmãs da esposa (que, se calhar, nunca arranjarão um homem) e o irmão da esposa , que nada faz de há oito anos para cá. Observe-se que esse grupo não contém quem quer que seja da família do marido. Só dela. Era assim na Idade das Trevas e continua a sê-lo ainda hoje.

Groucho Marx (1895-1977), Memórias de um Pinga-Amor

sábado, 24 de maio de 2008

O POEMA DE RYOKAN


Há cerca de duzentos anos, viveu no Japão um monge Zen muito especial chamado Ryokan. Nunca vi uma vida mais humilde, profunda e real do que a sua. Como provavelmente sabem, certa vez ele escreveu um curto poema quando descobriu que um ladrão lhe tinha roubado todos os seus escassos haveres. De facto, na sua cabana apenas havia as coisas essenciais para o seu dia a dia, tais como um par de cobertores velhos, um pincel, tinta, papel, uma toalha e uma bacia para se lavar. Ryokan escreveu:


« O ladrão deixou

A lua

Na janela »


HÔGEN YAMAHATA (1935), Folhas Caem, Um Novo Rebento

quinta-feira, 22 de maio de 2008

AS ILHAS AFORTUNADAS


Que voz vem no som das ondas

Que não é a voz do mar?

É a voz de alguém que nos fala,

Mas que, se escutamos, cala,

Por ter havido escutar.


E só se, meio dormindo,

Sem saber de ouvir ouvimos,

Que ela nos diz a esperança

A que, como uma criança

Dormente, a dormir sorrimos.


São ilhas afortunadas,

São terras sem ter lugar,

Onde o Rei mora esperando.

Mas, se vamos despertando,

Cala a voz, e há só o mar.


Fernando Pessoa

quinta-feira, 15 de maio de 2008

FERNANDO FAVA LANÇA O SEU LIVRO

Convidam-se todos os Associados da ALTERNATIVA a comparecer na Galeria Santa Clara, pelas 18 horas do próximo dia 20 de Maio (Terça-Feira). Aí ocorrerá o lançamento do livro do DR FERNANDO FAVA, intitulado Leonardo Coimbra e a 1ª República. Percurso político e social de um filósofo, integrando a "Colecção República" que está a ser publicada pela prestigiosa Imprensa da Universidade de Coimbra. O livro será apresentado pelo DR MÁRIO RUI ALVES DIAS. Queremos sublinhar que tanto o Dr. Fernando Fava como o Dr. Mário Rui Alves Dias são Companheiros muito activos da nossa Associação. A valia intrínseca da obra e a capacidade intelectual do apresentador auguram uma sessão extremamente enriquecedora. Daí que se apele à disponibilidade dos que puderem estar.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

COMO CORREU A NOSSA 4ª TERTÚLIA







No passado dia 12 do corrente, na Galeria Santa Clara, decorreu de modo animado a nossa 4ª "Tertúlia Alternativa". O tema, versando sobre as Bandas de Música como fenómeno artístico e social, foi introduzido pelo nosso Associado André Granjo. Discorreu ele, com a pertinência e competência que lhe é reconhecida, sobre o tema em apreço. Foi-nos dado saber quais as diferenças fundamentais que subsistem entre as Orquestras Sinfónicas e as Bandas de Música. Estas últimas, longe de estarem confinadas a execuções musicias de mero entretenimento e diversão, também podem e devem interpretar peças eruditas. E as melhores fazem-no com rara proficiência, superando, em muitos casos, as Orquestras Sinfónicas de substância artística e técnica mais débil. André Granjo, apoiando-se em imagens e som de grande qualidade, apresentou-nos a evolução histórica das Bandas de Música em Portugal, sobretudo desde os inícios do século XIX à actualidade. Foi uma jornada grandemente valorizadora para os que puderam e quiseram estar presentes. Este evento contou com a presença de alguns dos Associados mais jovens, em conjugação com a presença dos mais veteranos, como as imagens demonstram.



segunda-feira, 12 de maio de 2008

JOSÉ DIAS LANÇA O SEU LIVRO

A ALTERNATIVA - Associação Cultural associa-se, com júbilo e solidariedade, ao lançamento do livro do seu Associado José Dias. As Memórias do Cidadão José Dias serão apresentadas ao público de Coimbra no próximo dia 14 de Maio, pelas 18 horas, na Livraria Almedina-Estádio. O "Cidadão José Dias" tem vindo a marcar um lugar de relevo na dinamização do movimento associativo e cultural do País, nomeadamente no que diz respeito a Coimbra. É ele o actual Presidente do Conselho da Cidade. E é de esperar que as suas "Memórias" nos tragam importantes novidades sobre a vida política portuguesa, especialmente na fase coincidente com o mandato presidencial do Dr. Jorge Sampaio, de quem José Dias foi próximo Colaborador. Dentro da ALTERNATIVA, José Dias tem sido uma presença vigilante, crítica e interveniente. É sempre escutado com a atenção que nos merecem as pessoas esclarecidas e experientes, sendo certo que algumas das nossas "afinações" muito devem à sua postura sincera, cooperante e sempre leal. Assim, muitos dos nossos Associados estarão certamente presentes no lançamento do livro de José Dias, para lhe darem o abraço de que ele é indiscutivelmente merecedor.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

4ª Tertúlia da ALTERNATIVA

O Maestro e Académico Dr. André Granjo (na imagem) irá introduzir, na próxima Segunda Feira, dia 12 de Maio, às 21h30m, no lugar do costume (Galeria Santa Clara), o tema a debater na nossa 4ª Tertúlia. Desta vez, iremos conversar sobre Bandas de Música em Portugal - Um fenómeno artístico e social . O nosso Associado André Granjo possui créditos importantes na área em causa. Reparemos neste seu abreviado currículo:

" Nascido na freguesia de Oiã, no ano de 1975, o jovem maestro André Filipe de Oliveira Granjo, adquiriu os primeiros conhecimentos de música logo aos quatro anos de idade, na Academia de música A Tecla.
De uma família tradicionalmente dedicada à música, foi com seu pai, Silas de Oliveira Granjo, e também com Álvaro Ferreira, que iniciou o estudo do clarinete, na escola da Banda Filarmónica da Mamarrosa, aos sete anos. Três anos depois, aprofundou esse estudo, ingressando no curso de clarinete no Conservatório de Música de Aveiro.
Frequentou diversos cursos de direcção coral e instrumental com maestros como José Robert, Rogert Flieg, Roberto Perez, Edgar Saramago, Christopher Bochman Alberto Roque e Robert Houlian.
No seu percurso musical, é de referenciar a sua participação como maestro convidado no Orfeon Académico de Coimbra, a sua colaboração como elemento do Grupo de Instrumentos de Sopro de Coimbra, da Orquestra Típica e do Coral de Águeda, das Orquestras Ligeira e de Sopros do Conservatório de Aveiro, da Banda Marcial de Fermentelos e também da Tuna da Universidade de Aveiro. Detém, desde 1994, a batuta da Orquestra da T.A.U.C., altura em que iniciou o curso de Antropologia na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra.
A T.A.U.C. deve-lhe ainda a fundação do grupo Rags, em 1995, do qual é actualmente director artístico.
No presente, exerce ainda as funções de Clarinetista e Maestro assistente da Banda da União Filarmónica do Troviscal.
Presentemente é maestro titular da Banda da União Filarmónica do Troviscal, da Orquestra e do grupo Big Band Rags da T.A.U.C. e maestro convidado da Banda Municipal de Silleda (Pontevedra) e da Orquestra de Sopros de Jovens da Região da Charantes (França).

Em Novembro de 2005 terminou com a avaliação de Muito Bom o Curso de Mestrado em Direcção de Banda na Zuid-Nederlandse Hoogeschool fur Musiek em Maastricht (Holanda) onde foi aluno do Maestro Jan Cober ".

Não é necessário dizer mais nada.

Lá estaremos, então!

domingo, 4 de maio de 2008

TEXTOS EXEMPLARES - "O Encontro"

Por vezes, sem qualquer esforço, sou uma atmosfera ou identifico-me com um arvoredo, com a sua cor sombria, cor de veludo e silêncio, cor de estar ou ser, intemporal e densa. Eis onde vivo por momentos. Onde sou uma respiração do silêncio. Ou então uma encosta. Umas quantas janelas onde já ninguém vem assomar-se. Uma faixa oblíqua de cor ensimesmada no abandono de uma tristeza que é um gesto da imobilidade. Alongado, profundo, externo gosto de ser e nada mais. Estar ou ser no encontro tornou-se a exactidão pura de uma densidade tranquila e suficiente, internamente imensa. Contemplação intensa e calma, como liberta do desejo, e todavia a forma e o fundo do desejo como substância única, salva numa completa tranquilidade. Neste muro inabitável, por abandonado e solitário, está a mais viva e a mais sossegada habitabilidade do mundo. Sinto a vibração aérea do imperecível e todavia efémero. Sou agora, abandonando-me, o próprio encontro com o que não responde e que responde no silêncio do inanimado. Horizontal, vertical, estou reunido como uma pedra e não me afundo, não soçobro entre a sombra e a água.
António Ramos Rosa

sábado, 3 de maio de 2008

TEXTOS EXEMPLARES - "As Nuvens"

Hei-de aprender um ofício de que goste, há tão poucos, talvez carpinteiro, ou pedreiro. Construiria uma casa neste chão de areia com pedras húmidas, lisas, ou cheias de limos, frias, são tão bonitas, com seus veios cruzando-se, ou afastando-se de costas uns para os outros. Havia de meter-me por esses miúdos caminhos de chibas para ver, ao fim da tarde, chegar os saltimbancos em toda a sua glória, que me apontam as nuvens lentas, muito brancas, afastando-se.

Eugénio de Andrade