terça-feira, 9 de setembro de 2008

VELHOS CAMINHOS


Tal é a legenda dos velhos caminhos. […] Traçou-os o formigueiro humano com seu passo e repasso secular e os rebanhos no vaivém periódico entre a montanha e o prado. Desdenham da linha recta, como a mais fastidiosa de todas. O homem tinha o tempo por si e dons imperiosos de poeta. Esses caminhos, tão vagabundos como maviosos, hoje não seriam mais possíveis, pois que o nosso entendimento procede segundo outras coordenadas. Mas na Beira essas veredas medievais de feirantes e almocreves, de pé posto, sendas de cabras, atalhos, carreirinhos, para a fonte e para a mata, do poviléu, já antes do castro e mesmo da orca, eram todos assim: saltantes, sumidos e sinuosos como as ruas direitas das velhas cidades pré-afonsinas.

AQUILINO RIBEIRO (1885-1963), Arcas Encoiradas

13 comentários:

Anónimo disse...

AQUILINO RIBEIRO

Nas páginas do acervo literário
que Aquilino Ribeiro nos legou
perpassa a Beira que ele retratou
em todo o seu contexto originário.

Com seus penedos, matagais bravios,
míticos lobos, mouras encantadas,
castros e antas de épocas passadas,
nevõe de estarrcer, rostos sombrios,

de tudo um pouco fala o prosador
em cujos livros, contos e novelas,
se manifesta o génio do ecritor.

Nele se espelha o lusitano antigo
que para defender suas courelas
enfrenra sem temor qualquer perigo!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

A BEIRA É ELE!

A Beira, a Beira rústica, ancestral,
a Beira toda, a Beira é Aquilino,
cabeça e coração de Portugal,
a Beira como a vejo e determino.

Ninguém melhor do que eu, sem presunção,
a conheceu de dentro para fora,
desde a raiz da sua gestação
até aos tempos actuais, de agora.

A Beira é ele, do princípio ao fim,
de baixo para cima e vice-versa,
em todos os sentidos, quanto a mim.

A Beira é ele, autêntica e diversa,
do "Malhadinhas" às demais figuras
dos seus romances, livros e brochuras!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

"TERRAS DO DEMO"


A tudo que era reles, sujo e vil
com tua pena deste luta atroz:
teve mais peso e força a tua voz
do que um petardo ou bala de fuzil.

Com teu estilo agreste e virulento
e teu rijo arcaboiço de beirão
quebraste sem ter dó nem compaixão
os hórridos grilhões do pensamento.

Nunca ninguém te fez dobrar a espinha,
nunca vendeste a tua consciência
a troco de medalha ou louvaminha.

O ideal que incendiou a tua mente
foi que todo o país, de extremo a extremo,
não fosse uma infernal "terra do demo"!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

ESBOÇO PARA UM RETRATO


Faz-me vibrar irresistivelmente
a tua prosa máscula e viril,
mexe comigo, inflama toda a gente
o teu soberbo estilo varonil.

A tua fibra de beirão castiço
está presente em tudo quanto escreves
como se em ti houvesse um compromisso
com lobos, matagais e almocreves.

Com todo o ar de um português antigo
eras contudo, e não me contradigo,
um cidadão de espírito moderno.

O próprio Salazar te deu valor
quando apesar de hostil ao seu governo
te apelidou de altíssimo escritor!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

TRASTES DA BEIRA


Eu tenho a casa cheia de Aquilino,
recordações, lembranças das aldeias
que ele calcorreou desde menino,
móveis escuros, louças e candeias.

Se Camilo é o Minho brasileiro
e Torga o Trás-os-Momtes emigrante,
por sua vez Aquilino Ribeiro
é a pétrea Beira, autêntica e distante.

Não houve aldeia que eu não percorresse,
de carro, a pé, sozinho, acompanhado,
que ele não me surgisse... em todo o lado.

Foi uma sensação que não esquece,
aqueles trastes, mesas e cadeiras
curtidas pelo fumo das lareiras!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

SENHORA DA LAPA


Naquele casarão que foi colégio
dos padres jesuítas, no concelho
de Sernancelhe, a derruir de velho,
respira-se um estranho sortilégio.

É que foi lá, pegado ao santuário
da Senhora da Lapa, que Aquilino,
que tinha o sacerdócio por destino,
principiou seu curso secundário.

Foi lá, segundo o próprio confessou,
que através do latim, que lhe foi caro,
deu primorodo estilo ao seu aparo.

Há muito tempo já que lá não vou,
mas quando o leio vem-me sempre à mente
aquele sítio... onde ele está presente!

João de Castro Nunes

Luís Alves de Fraga disse...

Ler um texto, mesmo que minúsculo, de Aquilino é recuar ao uso esmerado da palavra escrita; é ver esculpido em letras um pensamento onde as palavras ganham formas agrestes ou transparências de puro cristal; é obrigarmo-nos a vergar com reverência perante o Mestre que nos ensina.

Anónimo disse...

"QUANDO OS LOBOS UIVAM"


Não sei se há lobos por aqueles lados
farejando os rebanhos à distância
como naqueles tempos recuados
em que existia ainda a transumância.

Por mim devo dizer que nunca os vi
em toda a Beira, interior ou não,
que outrora palmilhei, que percorri
em todos os sentidos sempre em vão.

De facto nunca os vi, de olhos nos olhos,
num frente a frente,o peito a descoberto,
quer isoladamente quer aos molhos.

Mas lá que os há... tenho a certeza disso
pelos seus uivos, pelo som castiço
do seu jeito de andar... que sinto perto!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

D. QUIXOTE EM CONTRAFAIXA


Depois de ler e ter apreciado
no texto original o D. Quixote
no Rocinante cavalgando a trote
com Sancho Pança a caminhar ao lado,

fui ler a versão lusa de Aquilino
que longe de ser mera tradução
é propriamente uma recriação
no seu robusto estilo genuíno.

Se é nobre o castelhano de Cervantes,
ouro de lei de altíssimo quilate,
não sei se vou dizer um disparate

ao afirmar que, embora semelhantes,
encontro em Aquilino outra beleza
na sua rude mofa à portuguesa!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

D. QUIXOTE EM CONTRAFAIXA


Depois de ler e ter apreciado
no texto original o D. Quixote
no Rocinante cavalgando a trote
com Sancho Pança a caminhar ao lado,

fui ler a versão lusa de Aquilino
que longe de ser mera tradução
é propriamente uma recriação
no seu robusto estilo genuíno.

Se é nobre o castelhano de Cervantes,
ouro de lei de altíssimo quilate,
não sei se vou dizer um disparate

ao afirmar que, embora semelhantes,
encontro em Aquilino outra beleza
na sua rude mofa à portuguesa!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

ROMÂNTICA MISÉRIA


Ninguém como Aquilino em seus escritos
refez o drama ingente de Camilo
sem pretender de modo algum feri-lo,
mas derrubando muitos dos seus mitos.

À sua verdadeira dimensão
o reduziu sem dó nem piedade
tentando pôr a nu toda a verdade,
porquanto as coisas são conforme são.

Aos olhos de um beirão como Aquilino,
pragmático, bravio quanto baste,
Camilo não passava de um cretino.

Afundou-se em miséria crassamente,
posto de parte pela sua gente
como quem deita à rua um velho traste!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

CANTEIRO DA PALAVRA

Com toda a sua garra de escritor
modelando a palavra à marretada
e golpes de cinzel, feito escultor,
os seus contrários reduzindo a nada,

Aquilino Ribeiro demonstrou
nas suas obras de investigação,
que em número avultado efectuou,
que as letras são o sal da erudição.

O que nas teses em geral não passa
de dados de uma insípida leitura,
que será tudo menos atraente,

em Aquilino tem montões de graça,
o que faz dele redobradamente
um grande vulto da literatura!

João de Castro Nunes

Anónimo disse...

"ABÓBORAS NO TELHADO"


Quando Aquilino, armado em polemista,
se bate com fervor por uma ideia,
na sua qualidade de humanista,
depois de ter deixado a sua aldeia,

não fere com punhal nem canivete
dissimuladamente, à falsa fé,
mas, à moda beiroa, de cacete
e se preciso for... a pontapé.

Rijo como os penedos da Soutosa,
intemerato, de carácter forte
a condizer com seu robusto porte,

ele fazia em pó, com sua prosa,
quem por velhacaria o afrontasse
ou com maus pensos lhe fizesse face!

João de Castro Nunes